Grandes mulheres da música contemporânea brasileira inauguram o maior palco do festival
A vibração e a unidade feminina que tomaram conta do Palco Mestre Dominguinhos, na última sexta-feira (22), refletiram em cheio a demanda atual em torno do feminismo e da conquista de espaço pelas mulheres. Mais do que uma homenagem ao gênero feminino, a noite foi um ato político protagonizado por elas. O empoderamento e a afirmação estiveram presentes na postura do palco, nas letras, no discurso e também na reação do público, que acolheu e correspondeu calorosamente às apresentações de Andréa Amorim, Larissa Luz, Karina Buhr e Elza Soares. Quatro vozes de timbres, influências, trajetórias e extensões vocais distintas, mas ligadas por um denominador comum: a aptidão de fazer do palco um espaço de luta.
Embora seja uma veterana do FIG, Karina Buhr preencheu a programação da noite de um jeito diferente por trazer, pela primeira vez à cidade, o show de Selvática, seu disco mais recente, cujo discurso entra em consonância com movimentos feministas e de igualdade de gênero. Antes mesmo de ser lançado, o disco já causara polêmica por conta de sua capa, na qual a cantora e compositora aparece de seios à mostra. Por outro lado, a polêmica contribuiu pra dar visibilidade ao trabalho, que ganhou ainda mais força e reconhecimento do público, além de amplificar a performance da artista, conhecida pelo comportamento explosivo. Enquanto esteve no Palco Dominguinhos, Karina fez jus à obra e não baixou a guarda. Gritou, provocou, mostrou toda sua fúria, ficou de maiô transparente e conquistou o público com sua postura subversiva em músicas como Eu sou um monstro, Nassira e Najaf, Conta Gotas e Pic Nic.
Antes dela, a baiana Larissa Luz deixou muita gente de queixo caído com sua performance singular e pra lá de empolgante. Larissa apresentou o repertório de seu segundo disco, Território Conquistado, uma fusão rítmica inspirada em referências de criadoras negras como Nina Simone, Thalma de Freitas, Elza Soares e a escritora Carolina de Jesus. Nas composições, Larissa enfatiza o direito de fala que sempre foi negado à mulher negra, realçando a necessidade de ser representada. “Fiquei super feliz com essa noite do FIG. Karina também tem um disco super afiado assim como o de Elza. É um marco que só me faz constatar que realmente estamos indo pra frente. Sabemos que existe uma diferença entre a mulher negra e a mulher branca, que é a oportunidade. Vejo que existe um movimento de crescimento e que estamos realmente conquistando espaços, por isso meu disco se chama Território Conquistado”, disse a cantora ao portal Cultura.PE após o show.
Uma das personalidades negras homenageadas por Larissa é Elza Soares, que gravou a faixa que dá título ao álbum e acabou encerrando a primeira noite do Palco Dominguinhos. “Quando decidi fazer um disco, olhei pra mim pra ver o que eu tinha de mais intenso e mais verdadeiro pra mostrar e me deparei com um processo de empoderamento, de me assumir, de gostar de mim do jeito que eu sou, do meu cabelo. Não só fisicamente, mas da minha identidade. E a Elza [Soares] estava sempre presente nesse processo. Porque ele é uma referência de mulher negra que esteve no mercado musical durante muito tempo, resistindo, e hoje está no auge de sua carreira. Chegar onde ela chegou dentro de todas as circunstâncias e dificuldades, pra mim, é muito louvável de se espelhar”, disse Larissa.
Justamente por isso, a apresentação de Elza Soares, encerrando uma noite cheia de mulheres empoderadas, não poderia ter sido menos consagrada. Não há exagero em dizer que o show entrou pra história do festival como um dos mais memoráveis, fazendo jus à carga de representatividade e ao impacto que o disco A Mulher do Fim do Mundo reflete para o contexto político e social brasileiro. Na breve entrevista que concedeu aos jornalistas, a cantora destacou que encontro musicais como este “é uma coisa que precisa ser feita mais vezes, essa união de mulheres, acho que a gente tá tendo a resposta que a gente queria”.
Fonte: http://www.cultura.pe.gov.br/